Olá, leitor! Dedico o post de hoje ao Sescanção, festival de música promovido pelo SESC/SE já em sua 14a edição, e do qual participei por oito vezes.
Sescanção 2013
Participei de muitas versões do Festival como integrante da banda-base. Para ser mais específico, em 2000, 01, 03, 04, 05 e 06. Em 2002 estava numa sintonia um pouco diferente, mas mesmo assim participei do Festival, só que como... jurado. Ao lado de Maria Lúcia Dal Farra, Paulo Lobo e outros.
Faz algumas edições (acho que esta é a 2a ou 3a vez) o festival começou a admitir músicas intrumentais entre as participantes. E este ano, inspirado por uma frase de Evandro Shiruder durante sua apresentação na Palco Music em maio, decidi inscrever pela 1a vez uma de minhas poucas músicas instrumentais. Evandro disse que admirava Richie Kotzen, dentre outras coisas pela sua grande produtividade (Um fato! RK deve ter uns 40 álbuns em sua discografia, iniciada no final dos 80s). Resolvi sair da inércia, sacolejar o baú e ver se algo dali se aproveitava. Para minha alegria, uma das 3 músicas que enviei foi selecionada. A balada “Universe”, numa pegada meio Pink Floyd, meio Steve Vai. E que foi escrita no início dos anos 90, antes mesmo de existir Sescanção.
O Festival deste ano, cujo mote destacou a diversidade musical, apresentou de fato um grande mix de estilos. O choro de Brasileiríssimo e Os Tabaréus do Choro, a Nova MPB de Héloa, o rock de Os Lêmures, o (obviamente) samba de Samba de Moça Só etc. E lá estava eu no meio deles, reciclando meus velhos licks virtuosos - tão em voga no final dos 80s, quando comecei a tocar guitarra, influenciado pelo Metal e Hard Rock de Van Halen, Metallica, Iron Maiden, dentre outros.
Universe
“Universe” é uma música que escrevi no começo dos anos 90. Lembro-me de ensaiá-la com a 1a encarnação do Hemisferios ainda, com Fernando Bueno e Zé Milton, e salvo engano ela tinha uma letra. Basicamente eram os arpejos da base, com alguns efeitos de teclado, algo meio Rush, meio Floyd.
Tempos depois construí um solo sobre essa base, pegando emprestado muitas ideias de Steve Vai, guitarrista que fez minha cabeça na virada dos 80’s pros 90’s. Quando toquei na banda Graal, em 1994, com Rominho (bateria), Rony Medeiros (percussão), Wellington Mendes (trompete/arranjos), Robert Wagner (teclado) e Melcíades ("pai", baixo) ela integrou o repertório, embora destoando da pegada jazz/pop da banda, que tinha no seu repertório Santana, Chuck Mangioni, alguns standards, algumas autorais, etc.
E é justamente do ano de 1994 a última lembrança que tenho de tocar ao vivo “Universe”. Gravei-a de modo precário em 1997, no meu TASCAM de 4 canais (e fita K7 como mídia), com bateria programada por mim numa Roland DR-5, divulguei-na na ainda incipiente Internet dos 90s, com precário streaming e acesso discado, e depois ela foi pro fundo do baú. Acho que tinha meus motivos para tal: a música não possuía um tema definido, era apenas um longo solo de 4 minutos de duração, um guitar showcase que depois de algum tempo começou a soar enfadonho e distante da música que eu começava a apreciar, músicos como Steve Morse, Pat Metheny, Eric Johnson dentre outros. Para complicar a vida de Universe, escrevi depois a balada “Mother”, que tinha um feeling parecido, só que melhor definida enquanto tema, com direito a tonalidade paralela e outros truques composicionais. Universe, apesar do nome pomposo, e não obstante a textura interessante, é apenas um longo vamp sobre o modo eólio. Portanto, recebi com surpresa sua classificação para a Mostra do SESC. Eu achava que outra das 3 músicas que inscrevi, um baião, teria mais chances e até falaria mais a “linguagem do festival", que historicamente vem destacando artistas com forte pé no regionalismo, como Kleber Melo, Sena e Nino Karvan.
Cabe dizer que tenho uma visão bipolar dessa coisa de guitar-hero (como jocosamente me chamava Fabinho nas reuniões e ensaios). Ao mesmo tempo em que adoro o estilo, acho essa coisa de solos impossíveis meio enfadonha e caricata. Não sei se teria neurônios (pra decorar tantas notas) e estômago para, por exemplo, fazer um show que passasse de uma hora com esse tipo de música. E por isso mesmo um dos caras que mais admiro é Paul Gilbert, que apesar de possuir técnica ultra-desenvolvida mantém postura bem-humorada sobre sua própria condição de “herói”, sendo fã dos Beatles (escancara isso no álbum “Flying Dog”) e reinventando-se sempre, como fez em “Get Out of My Yard” com seu hilário human capo.
Bem, música selecionada, era tempo de desenferrujar e reaprender - ou “reler” - aquilo que havia gravado em 1997. Muitas frases e licks nem faziam mais parte de meu vocabulário atual, de modo que os readaptei em vez de tirá-los ao pé da letra. Nos ensaios deixei os músicos bem à vontade, e tinha motivos para tal: a música possui uma base simples e 99% das partes complicadas cabia a mim executar; ademais, a gravação e arranjos já estavam prontos, a partitura tinha sido disponibilizada ao SESC e tendo sido da banda-base do festival por 6 vezes, quis “dar um refresco” aos colegas da versão 2013, sabendo que muito trabalho árduo ainda os aguardaria. No único ensaio que houve antes da passagem de som houve alguns desencontros, corrigidos sem muita convicção - e sem que eu intercedesse com muita ênfase. E fomos em frente.
Junior Di Lima, Rafael Jr, Vinnas e Theo Lins. Foto: Janaina Amarante |
No dia do Festival, durante a passagem de som no Teatro - na verdade era um ensaio com a mesma cadência da apresentação noturna - ocorreram desencontros também, e tivemos de parar a música no meio. Aquilo me preocupou, pois tinha visto os seis participantes prévios e todos estavam com suas músicas muito redondas, inclusive a de Mauri de Noronha, cujo arranjo possuía muitas convenções e dinâmicas. Comecei a entrar em pânico. Embora eu já tivesse, a exemplo dos pianistas de concerto, o mapa mental de todas as notas - e não eram poucas - que deveria tocar, uma cacofonia harmônica entre teclado e guitarra certamente me derrubaria. Em casa, enquanto me vestia pra voltar ao teatro, tive o insight e liguei pra Rafael Jr., isso já as 20 h. Disse a ele que estava preocupado, e que se houvesse algum erro eu pararia e começaria de novo. Ele passou a ligação pra Junior, baixista, e expliquei a ele o que estava acontecendo e o que deveria ser corrigido. “Senão eu paro!”, reiterei.
Meu velho amigo Barata fazendo as vezes de Wikipedia |
Chegada a hora da apresentação, entrei no palco sem grandes pretensões. Afinal, embora a música instrumental esteja crescendo em Aracaju a olhos vistos, muitos combos de jazz/MPB florescendo, espaços aparecendo, eu tocaria um ROCK instrumental. Com muita distorção. Com bends. Com vibratos de tom e tom e meio. Enfim, estava preparado para o “silêncio de quem estranha o desconhecido”, com aplausos esparsos aqui e ali e que eram tão usuais ao final das músicas nos shows que fiz com a Sulanca. Não tive tempo de timbrar direito, o ampli era um Marshall e eu havia setado o pedal Bogner RED em casa para voicing de Fender. Mas vamos que vamos! Não tive nem tempo de olhar no rosto das muitas pessoas - o teatro estava cheio - pois a música exigia concentração total. Ainda mais que eu vinha treinando-a numa guitarra com cordas 010 e arm contour (o chanfro) no tampo, e no dia levei minha Wolfgang, com cordas 009 e sem arm contour. Parece bobagem, mas em guitarras sem ele o antebraço sofre mais pressão e a mobilidade da palhetada, entre as cordas, perde muito se você estiver habituado a guitarras com ele. A performance não foi perfeita. Houve pequenos erros que, embora despercebidos da maioria, incomodam quem escreveu e sabe que a música não saiu 100% perfeita. Mas fomos até o final, sem erros na estrutura da música, e após arpejar o último acorde, um open sounding Em(7/9/11) - que toquei sozinho, na vibe do começo da música - aplausos efusivos inundaram meu coração de alegria. Como bem disse Rafael Jr. depois, a melhor performance foi a “da vera”. Ainda bem! Peguei minhas tralhas e voltei pro camarim. Dos músicos que lá se refestelavam com o banquete oferecido pelo SESC, recebi nova leva de aplausos. Fiquei satisfeito. A “leve pressão” funcionou e no fim tudo deu certo!
Por ora pouparei o leitor de ouvir a versão 1997 da música. Sem dúvida a que irá pro CD terá melhor qualidade sonora. Agradeço pela compreensão e peço paciência aos curiosos. Aliás, sou eu mais um, também muito ansioso pela vida que uma banda real, com músicos excelentes, há de conferir à minha obra.
Abraços e até o próximo post!
Coletânea de Links
Soundcloud
Youtube
Vídeo que eu mesmo produzi
com trechos da passagem de som e do show
Paul Gilbert e o "human capo"
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